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Os dados de suas pedaladas (humanizando a análise)

Parece que a febre pra treinar com potência parou um pouco. Não sei se é por conta do dólar alto e a dificuldade aumentada de adquirir um medidor de potência ou se é porque já está se tornando uma coisa normal. Acho que são as duas coisas juntas. Mas o que precisa ser dito é outra coisa. O simples fato de treinar com medidor de potência, não vai fazer ninguém andar mais. O que faz alguém andar mais é um treino bem planejado e um atleta dedicado pelo menos nos três pilares que levam ao aumento da performance: treinar (certo), comer (certo) e descansar (certo). 
Medidor de potência é uma ferramenta que enriquece demais a análise e prescrição de treinamento, mas todo e qualquer gráfico de qualquer programa (Golden Cheetah, WKO+, Training Peaks...) gerado pelos Watts das suas pedaladas, a curto e médio prazo servem pra pouca coisa se não estiverem ligados a dados que sejam expressão do esforço interno do organismo (carga interna), dado que a potência é carga externa. 
Faça o exercício de pedalar, depois de 2 dias de descanso, 30 minutos no equivalente a sua Z3 ou Zona Tempo ou entre 76 e 90% de seu FTP (equivalentes); em outro momento, faça o mesmo exercício depois de 4 dias de carga intensa de treino. Não, isso não tem o mesmo significado pro seu corpo, e você empurrou a mesma potência que no dia em que estava descansado. E agora? Sua carga de curto e longo prazo vão mudar, assim como o balanço de stress; mas essas ondas do gráfico expressam realmente o que se passa com você? 
Quantas vezes já tive atletas doentes em períodos de carga baixa! Quantas vezes a capacidade desses atletas estavam aquém ou além do esperado baseado *somente* no "Performance Manager Chart" (gráfico que reúne os dados)! Sabe porque acontece isso? Porque o responsável por gerar tantos dados, fica estressado, feliz, cansado, eufórico, ele ama, odeia, passa noite acordado cuidando do filho, perde entes queridos. Quem gera dados é uma pessoa, é um ser humano, não é uma máquina, portanto, esse ser humano precisa ser ouvido pra se ter a real dimensão do que ele pode ou não pode fazer. O plano de treinos precisa ser mudado muitas vezes em decorrência dessas interveniências.
Usar tecnologia para treinamento, sim, mas transformar o ser humano numa máquina, jamais. Em uma época em que a psicologia do esporte, a filosofia do esporte e valorização das relações humanas entre os atletas de alto rendimento é tão enaltecida, por que iríamos relegar a responsabilidade do entendimento do que acontece com nossos atletas a um software? Sim, esse software nos ajuda, mas não nos dá a real dimensão do que está ocorrendo diariamente com a pessoa por trás daqueles dados. Portanto, ouvir e considerar o que o atleta diz é uma obrigação, e não uma opção.